Meu reino está debaixo das terras; abaixo das profundezas do mar, acima dos limites do céu. Aqui, quem delimita as regras sou eu, e apenas eu posso mudar qualquer coisa ou situação que aconteça. Talvez seja por isso que eu passo tanto tempo inventando e depois reinventando as coisas; é parte da nossa mera imperfeição.
Do que adianta um exército sem comandante; do que serve um jardim sem flores; do que adianta os barcos sem os mares e oceanos; do que adianta o cálice sem vinho; do que adianta meu coração batendo sem sangue; do que adianta meu reino sem rainha...
De nada me serve meu reinado e meus súditos sem uma rainha para reverenciar; nada substitui a delicadeza e ao mesmo tempo a rigidez de tua mão, minha rainha, perante teu reino. Tu governas com extrema rigidez, mas jamais deixa teu toque macio e delicado longe do teu povo que tanto precisas de ti.
Óh doce rainha, musa inspiradora dos meus sonhos, eterna inspiração dos meus versos e razão única da minha respiração; sonho acordado todos os dias com o momento em que poderei tomar meu cavalo, e percorrer todo o mundo até onde tu estás, adormecida pela própria beleza sem contemplação, e poderei trazer-te nos braços para tua terra, onde és venerada e idolatrada, como símbolo incondicional do resplendor da beleza e da doçura com que moves terras e águas, céus e infernos, picos e abismos para eternizar tua presença viva dentro do coração aflito e descompassado deste teu cavaleiro.
Justiça cega, braço imerso na bondade mas que julgas com sabedoria extrema cada gesto de teu exército, porque ouso ainda considerar que serás minha a missão de te trazer de volta ao teu povo, já que tantas vezes duvidei de ti, em tuas palavras e em teus gestos de imparcialidade tão meiga? Serás que, ainda depois de colocar-me a mim próprio como súdito inconseqüente e cavaleiro intolerante de tua corte, me darás a honra de ser teu guardião em tua viagem de volta a teu reino e estar à frente de tuas tropas, mesmo que não seja em guerra?
Estar a frente de teu exército, estar na primeira linha de fogo, e conduzir tua carruagem és honra para qualquer cavaleiro que já tenha um dia usado uma espada forjada pelas chamas de teus olhos. Espada eterna, infinita, de poder sem precedentes, e elo eterno com tua alma. Posso empunhá-la, em tua defesa, ou em comando de teu exército em tua escolta?
Não sei mais se serei aceito em tuas tropas; não honrei tuas sábias palavras e duvidei de tua pureza e bondade de coração que somente tu tens ainda. Não espero que me deixes mais chegar com meu cavalo tão perto de teu castelo, pois meu merecimento morreu no momento em que pela primeira vez fui infiel às tuas ordens; somente a não condenação à morte de minha alma já demonstraria que tua bondade estás ainda acima do que consigo ver ou imaginar, e serias o suficiente para que pudesse passar o resto de meus dias te adorando mesmo declinado de teu exército, e retirado de teu reino, confinado a ficar para sempre ao relento das montanhas, longe da beleza de teus olhos ou privado de ter meu manto sob seus pés, para que não pises em chão impuro.
Antes que eu desrespeite a corte, e parta em sua busca, sozinho com meu cavalo e minha espada, que certamente tirarás de mim por não ser mais digno de empunhá-la, deite sobre minha fronte tua condenação, pois aceitarei humildemente meu exílio. Sei que jamais poderias ter duvidado de tuas palavras, em teu trono brilhante de pedras preciosas, achando que, por um instante, seria mais sábio do que ti. Perdão, minha rainha, por toda minha insolência e minha trajetória retrógrada em tuas tropas.
Tudo que te peço agora, és uma morte honrosa, pela tua mão. És o sacrifício que mereces por minha deslealdade, e coloco minha vida em tuas mãos. Uses minha própria espada, que já não tenho mais dignidade de usar, e como último golpe dela, que sejas em minha cabeça, cortando-a, como separando o que és inútil em teu castelo.
Faço de minha vida a eternização do arrependimento pelos atos subalternos que tive em teu reino; sacrifica-me como prova de que me perdoas, que renascerei como a ave fênix das cinzas para te servir novamente, mas desta vez, queimada pelo fogo eterno de tua alma.
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